terça-feira, 16 de janeiro de 2018

O grande mal da opinião pública (publicada)





Já pelos tempos de Joaquim Manuel de Macedo (1820-1882) o romancista em questão grafou no seu clássico “A luneta mágica” que “[...] A opinião pública é a rainha do mundo [...]” Não imaginava ele que sua “rainha” seria do mal, pois com as ferramentas da psicologia de massa, e da tecnologia, apelando para a certeza de que se comunicam com um povo ignaro, os protagonistas da comunicação tornariam essa “opinião pública” uma “opinião publicada”. E não somente pela palavra escrita, mas pela fala posta nas ondas do rádio e nas imagens da tevê, além, claro, de palavras e imagens disseminadas como praga nas redes sociais. E mais ainda, por sua aparente simplicidade, tornaram-se as fotos e os desenhos (charges) as linhas de frente da comunicação massificada, eis que são as que mais estimulam a preguiça dos incultos que não leem nem raciocinam nada. E eles são milhões...


Por isso a charge sempre vem em destaque na mídia, seja ela animada para a telinha da tevê ou apenas desenhada e grafada em jornais e revistas. Seu poder de comunicação é impressionante. Porque parte da premissa de que o povo não gosta de ler e prefere absorver o que lhe dá menos trabalho, que é o de olhar a imagem e concluir conforme a sua intelectualidade ou a sua estupidez, mais a segunda hipótese. E é tão forte esta comunicação por imagens que ela leva à ira extrema as pessoas, a ponto de praticarem atentados contra seus protagonistas, como se viu recentemente na França. Mas aqui no Brasil, considerando-se a histórica subalternidade das massas, as reações não ultrapassam as manifestações de indignação totalmente inócuas diante da realidade de que a charge e a foto, juntas ou separadas, alcançam rapidamente o espírito do povo, em boa parte agradando-o, e em exceção indignando-o.


É nesse meio de cultura que surgem os talentos voltados para o mal ou para o bem, dependendo de quem desenha e de quem observa o desenho ou a foto, ou assiste na telinha alguma comunicação com fins geralmente inconfessáveis. Na verdade, esses meios de comunicação acompanham a tendência “do contra” adrede introjetada no espírito do povo. É como juntar a fome com a vontade de comer, ficando os atingidos por esse insidioso meio de comunicação como seus alvos preferenciais, sendo a PM o mais atraente, não importando aos mentores e autores as indignações nem os prejuízos que decorrem do estímulo à ira do PM contra eles e contra o povo. Pois esta ira se materializa em excesso no uso da força contra esse mesmo povo que ri deles e aplaude as charges pejorativas, mesmo que, em raras às vezes,  a ideia do chargista seja a de retratar a realidade presente, como no caso em sublinha, que retrata a mais pura verdade, é fácil, muito fácil, a morte alcançar o PM no seu dia a dia de atuação na segurança individual e comunitária do cidadão. Ora, por que o povo odeia a PM, se ela existe para protegê-lo e morre muito por isso? Seria uma contradição?...


Talvez, talvez... Ora bem, um dos motivos é aberrante, o povo sabe que o mesmo PM que se propõe a combater criminosos para defendê-lo é o que põe o capacete, o escudo e outros aprestos para contê-lo na base da violência em manifestações, muitas delas mais que justas, contra sistemas estatais e particulares que não o respeitam enquanto povo trabalhador. Esta contradição, dentre muitas outras, reforçam a ideia popular de que a PM (nem digo a polícia em geral) é “inimiga” do povo e não a sua protetora. E é neste estado de espírito coletivo, e negativo, que a charge penetra como punhal afiado bem no coração do PM enquanto instituição e enquanto pessoa individualizada, situação, aliás, rara, pois geralmente eles pensam e agem em grupos psicológicos cujas ideias e ações se expandem na velocidade do raio. Então, se esses grupos psicológicos são o combustível, as palavras de demérito, as fotos e as charges são o comburente e o calor a provocarem irados incêndios, num círculo vicioso que aqui no Brasil tão cedo não terá fim. Pois aqui não ocorre a máxima de Erich Fromm: “A calamidade é ruim para o povo, mas boa para a sociedade”.


 Sim, a tragédia talvez seja o único caminho para se mudar uma sociedade, como vimos no soerguimento do Japão após as bombas atômicas, para não nos alongarmos. Portanto, enquanto não houver uma grande tragédia que una a todos em torno de um objetivo comum e grandioso, a sociedade brasileira continuará no seu círculo vicioso, que gravita entre a formalidade e a informalidade do “você sabe com quem está falando?” e “para os amigos tudo, para os inimigos os rigores da lei”, frases que resumem a imprensa de hoje, que, unida por compadrio ao Ministério Público, e, por via de consequência ao poder da justiça, escreve o que bem entende, fala o que bem entende, desenha o que bem entende, e sempre sai imune (impune) neste país que hoje é comandado por marginais de terno e gravata e por rotos e esfarrapados armados até os dentes e dominando as favelas e boa parte do asfalto. Daí a certeza do chargista de que será aplaudido pelo povão e vaiado por meia dúzia de indignados: os mesmos de sempre, poucos em relação ao todo, como a formiguinhas mordendo patas do elefante.

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